Cármen Lúcia: "Há discriminação contra a mulher, mesmo contra juízas" :: 15/09/2016 (16:59:47)
Presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, durante reunião com 25 governadores Governadores discutem guerra fiscal e judicialização da saúde com...
Publicado em: 15/09/2016

Presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, durante reunião com 25 governadores Governadores discutem guerra fiscal e judicialização da saúde com nova presidente do STF

A ministra Cármen Lúcia toma posse como presidente do STF, aplaudida pelo presidente do Senado Renan Calheiros, à esquerda, e pelo presidente da república Michel Temer, à direita

— O fato de o legislador ter tomado esta decisão foi baseado em um quadro social que continua a prevalecer grandemente. Há discriminação contra mulher, ao contrário do que aqui foi dito. “Ah, tem mulheres conduzindo um Boeing”. A simples referência a isso já demonstra a discriminação. Porque ninguém fala que tinha um homem sentado aqui deste 1828, deste o Supremo Tribunal de Justiça. Isso não é novidade. É o fato de continuar a ter discriminação contra a mulher é que nos faz precisar ainda de determinadas ações positivas. Se fosse igual, ninguém estava falando — reclamou Cármen Lúcia.

Para demonstrar a importância das leis na política de igualdade de gêneros, a ministra mencionou frase dita por Carlos Ayres Britto, hoje aposentado, no julgamento sobre o direito de abortar fetos com anencefalia. Britto disse que o STF só estava discutindo a questão porque quem faz a lei é o homem e quem fica grávida, a mulher. Cármen Lúcia disse que há preconceito contra mulheres em todas as áreas de atuação, inclusive na magistratura.

— Há sim discriminação contra a mulher, mesmo em casos nossos de juízas, que conseguimos chegar à posição de igualdade. Há sim enorme preconceito contra nós mulheres em todas as profissões. Eu convivo com mulheres que o tempo todo são descriminadas — disse.

A ministra deu também o exemplo do sistema eleitoral. Afirmou que não são dados às mulheres reconhecimento, tempo de televisão ou espaço nas direções partidárias. Esse seria o motivo, na análise dela, de haver poucas mulheres eleitas para cargos públicos no país.

— Temos uma sociedade, ministro Gilmar, extremamente preconceituosa em vários temas, racista em vários temas e, no caso da mulher, muito preconceituosa. E aí estou falando de cátedra — declarou Cármen Lúcia.

Para amenizar o clima, a presidente disse que tinha certeza de que o colega estava pedindo vista do processo para pensar melhor, e que não tinha dúvida de que ele votaria de acordo com os preceitos constitucionais de proteção à mulher. Cármen Lúcia concluiu dizendo que Gilmar era muito cuidadoso na análise do tema. Por fim, a ministra fez piada e arrancou risos dos colegas.

— Nós queremos a igualdade de direitos exatamente na dignidade que se encerra na identidade de cada um. Graças a Deus, dá certinho esse negócio de homem e mulher, é ótimo — observou.

— Disso ninguém aqui discorda — respondeu Gilmar.

— Pelo amor de Deus, só faltava pedir vista disso também! — riu Cármen Lúcia.

Para se explicar melhor, Gilmar pediu a palavra e reconheceu que existe sim preconceito contra a mulher. No entanto, ele estranhava o fato de, exercendo as mesmas atividades, as mulheres terem direito ao descanso de 15 minutos. Marco Aurélio prosseguiu no debate e disse que esse tipo de regra contribuía para que a sociedade brasileira continuasse machista. A presidente fez uma cara de estranhamento, mas não quis prolongar a discussão, encerrando o julgamento.

No primeiro dia presidindo uma sessão, Cármen Lúcia impôs um ritmo mais intenso de trabalho ao STF. Na gestão de seu antecessor, Ricardo Lewandowski, as sessões começavam por volta das 14h30 e terminavam às 17h. A nova presidente disse que quer começar pontualmente às 14h e terminar às 18h, com um intervalo de meia hora no meio das sessões. Dependerá dos demais ministros cumprir o horário à risca. Nesta quarta-feira, ela bem que tentou, mas às 14h ainda não havia o número mínimo de ministros em plenário para iniciar os julgamentos.

Fonte: O Globo