Greve e câmbio abatem ganho das indústrias no 2º tri :: 12/09/2018 (10:13:22)
A greve dos caminhoneiros e a desvalorização do real ante o dólar atingiram em cheio a rentabilidade da indústria no primeiro semestre, mostra estudo exclusivo do Instituto de Estudos para o...

A greve dos caminhoneiros e a desvalorização do real ante o dólar atingiram em cheio a rentabilidade da indústria no primeiro semestre, mostra estudo exclusivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) obtido pelo Valor. E, de quebra, também comprimiram os investimentos, que perderam tração após ensaiarem uma retomada mais vigorosa desde o segundo trimestre do ano passado.

A partir da análise dos balanços de 135 companhias industriais, com exceção da Petrobras e da Vale, o levantamento conclui que a pisada no freio ocorreu sobretudo no segundo trimestre. No período, a margem líquida de lucro dessas empresas, ou seja, o que efetivamente da receita vira lucro, passou de 5,7% para -2%, o que, na prática, significa prejuízo. Já a cifra consolidada do primeiro semestre caiu de 2,9% para 1,7% de um ano a outro, a menor rentabilidade desde 2015.

A parada do setor produtivo também afetou a margem operacional (razão entre o lucro antes de juros e impostos e a receita). No início de 2018, com as perspectivas mais otimistas de crescimento, as empresas estavam recompondo os estoques e ganhando escala de produção. Assim, a margem operacional atingiu 11,5% no primeiro trimestre, excluindo Petrobras e Vale. De abril a junho, porém, o percentual voltou a cair, para 8,7%.

O Iedi nota que o recuo de ambas as margens - de lucro e operacional - inibiu um processo mais consistente de investimentos produtivos. O indicador de despesa de capital sobre depreciação, uma medida para o investimento líquido, desacelerou e mantém-se em patamar baixo.

"Apesar de certa recuperação, os investimentos das empresas industriais analisadas alcançaram no 2º trimestre cerca de 40% do volume do 1° trimestre de 2015", afirma o economista do Iedi, Rafael Cagnin. Na avaliação do especialista, o ambiente para os investimentos, em meio à ociosidade elevada, já não era dos mais propícios neste ano. "Depois, a greve afetou a confiança, e a ´cereja do bolo´ foi o ambiente político nada favorável."

A perda de vitalidade da recuperação da indústria - e o reflexo direto nos balanços - é anterior à greve e entra em um contexto menos positivo para a atividade neste ano, ressalta Cagnin. "O ponto central é que essa reativação da indústria é insuficiente por ser lenta e cheia de descontinuidades. A atividade no setor não estava tão ruim, mas também não engrenou um quadro de recuperação consistente", diz.

O economista destaca que o momento mais frágil da indústria também coincide com o aumento das incertezas na política com a proximidade das eleições presidenciais e o efeito disso nos custos atrelados à taxa de câmbio. "O câmbio desvalorizado, apesar de elevar a competitividade dos produtos brasileiros a médio e longo prazos, afeta as estatísticas patrimoniais instantaneamente. Primeiro, impacta as empresas que possuem passivos em dólar e, depois, afeta os setores que têm insumos importados", diz. No fim de junho, o dólar estava em torno de R$ 3,90.

A piora na condição financeira na indústria pode ser medida pela cobertura dos encargos financeiros pelo lucro operacional (Ebitda sobre despesas financeiras). O indicador estava em 1,7% no primeiro trimestre, o que significa que a geração de lucros superou as despesas com uma diferença de 70%. Entre abril e junho, porém, o percentual caiu a 0,61%, ou seja, o lucro operacional não honrou os custos financeiros. Em volume, as despesas financeiras subiram de R$ 26,8 milhões para R$ 47,1 milhões entre um ano e outro, segundo o estudo.

Também cresceu no período o endividamento bancário das grandes indústrias, que aumentou em quatro pontos percentuais, para 88% do capital próprio. O perfil, porém, foi mais favorável, com diminuição nos débitos de curto prazo e elevação nos de longo prazo. Em média, houve um aumento de R$ 348 bilhões no segundo trimestre de 2017 para R$ 362 bilhões em igual período deste ano.

O estudo também levantou os resultados em serviços e no comércio, totalizando 322 balanços de empresas de capital aberto não financeiras, que registraram desempenho melhor do que a indústria em qualquer comparação. No segundo trimestre, o segmento de serviços, excluindo as companhias de energia, viu a margem líquida de lucro cair 1,8 ponto percentual, de 9,3% para 7,6%, enquanto a do comércio subiu 0,2 ponto, de 2,7% para 2,9%. Já o tombo das indústrias no período foi de 7,7 pontos.

A indústria só consegue números menos tímidos com a inclusão da Petrobras e da Vale na conta. Nesta análise, a margem líquida de lucro cresceu no primeiro semestre, para 5,1%, de 4,4%, embora o resultado do segundo trimestre - 2,4%, ante 8,1% no início do ano - seja o menor entre os três segmentos.

Ainda de acordo com o levantamento do Iedi, o prejuízo no segundo trimestre foi sentido nos ramos de alimentação, construção civil, material aeronáutico, metalurgia, papel e celulose e têxtil. E, mesmo entre os que conseguiram sustentar margens positivas, o desempenho foi inferior no segundo trimestre. Neste grupo, entram as indústrias de autopeças, siderurgia, química e de eletroeletrônicos.

Fonte: Valor Econômico